Artículos
Depois de mim, o dilúvio: uma crítica marxista às sementes-mercadoria no capitalismo contemporâneo
After me, the deluge: a marxist critique of commodity seeds in contemporary capitalism
Después de mí, el diluvio: una crítica marxista a las semillas-mercancía en el capitalismo contemporáneo
Estudios Rurales. Publicación del Centro de Estudios de la Argentina Rural
Universidad Nacional de Quilmes, Argentina
ISSN: 2250-4001
Periodicidade: Semestral
vol. 14, núm. 30, 2024
Recepção: 24 Janeiro 2024
Aprovação: 15 Julho 2024
Resumo: Sob o capitalismo, as sementes foram transformadas em mercadoria, dotadas de valor de uso e valor. Essa metamorfose das sementes foi identificada por Marx, que apontou que os germoplasmas tenderiam a ingressar no processo corrente de produção e a ser comercializados regularmente. A previsão marxiana pôde ser notadamente confirmada no século XX, com a disseminação de sementes vendidas por empresas e o forte apelo propagandístico por sua incorporação à agricultura. A técnica de hibridização permitiu que as corporações empresariais pudessem interferir no comportamento das variedades, logrando um rendimento agronômico decrescente. Décadas depois, novas intervenções surgiram, como a transgênese de sementes e a edição genética, provenientes de manipulação de genes para imprimir características alheias ao funcionamento dos germoplasmas. A hibridização e, sobretudo, os organismos geneticamente modificados são evidências da subsunção real da natureza ao capital, mantendo uma íntima conexão com a tentativa das corporações empresariais de controlar os códigos genéticos dos bens naturais do planeta. Uma situação que, indubitavelmente, aprofunda a ruptura metabólica da relação humana com a natureza. O presente artigo realiza uma análise da problemática das sementes-mercadoria, identificando as principais contradições inerentes ao domínio capitalista sobre um organismo vivo tão precioso à (re)produção da vida humana. O pressuposto é que as manipulações genéticas nas sementes são um dos pilares da crise ecológica em curso. Parte das publicações de Marx e de autores influenciados por ele sedimentam a base teórica da reflexão. Espera-se que o texto contribua para a crítica necessária ao dilúvio capitalista que nos atormenta.
Palavras-chave: sementes-mercadoria, subsunção real da natureza ao capital, fratura metabólica.
Abstract: Under capitalism, the seeds were transformed into commodities with value and use-value. This seed metamorphosis was identified by Marx, who pointed out that the germplasms would tend to enter the production process and be regularly commercialized. The Marxian prediction could be notably confirmed in the 20th century, with the dissemination of seeds sold by companies and the strong advertising appeal for its introduction in agriculture. The hybridization technique allowed business corporations to interfere in the seed variety behaviour, obtaining a decreasing agricultural income. Decades later, new interventions occurred, such as seed transgenesis and the gene editing, which are alterations in the genes to imprint characteristics that are unrelated to their germplasm. Hybridization and, above all, the genetically modified organisms are evidence of the real subsumption of nature to capital, keeping a close connection with the corporations' attempts to control the genetic codes of natural goods of planet. It is a situation which undoubtedly deepens the rift metabolic between the human and nature relation. This article analyses the commodity seed issue, identifying the main contradictions inherent in the capitalist control over a living organism, precious to (re)production of human life. The assumption is that the seed genetic manipulations are one of the pillars of the ongoing ecological crisis. Part of publications by Marx and other authors influenced by him solidify the theoretical basis of this reflection. We hope this text contributes to the necessary critique to the capitalist deluge which threatens us.
Keywords: commodity seeds, real subsumption of nature to capital, metabolic rift.
Resumen: Bajo el capitalismo, las semillas se transformaron en mercancía, dotadas de valor de uso y valor. Esta metamorfosis de las semillas fue identificada por Marx, quien señaló que los germoplasmas tenderían a ingresar al proceso de producción y venderse regularmente. La predicción marxiana se confirmó notablemente en el siglo XX, con la difusión de semillas vendidas por empresas y el fuerte llamamiento propagandístico para su incorporación a la agricultura. La técnica de la hibridación permitió a las corporaciones empresariales interferir en el comportamiento de las variedades, logrando un rendimiento agronómico decreciente. Décadas más tarde, surgieron nuevas intervenciones como la transgénesis de semillas y la edición genética, resultantes de la manipulación de genes para expresar características ajenas a la constitución de los germoplasmas. La hibridación y, sobre todo, los organismos genéticamente modificados son evidencias de la subsunción real de la naturaleza al capital, manteniendo una íntima conexión con el intento de las corporaciones empresariales de controlar los códigos genéticos de los bienes naturales del planeta. Una situación que indudablemente profundiza la ruptura metabólica de la relación humana con la naturaleza. El presente artículo analisa la cuestión de las semillas-mercancía, identificando las principales contradicciones inherentes a la dominación capitalista sobre un organismo vivo tan valioso para la (re)producción de la vida humana. Se supone que las manipulaciones genéticas en las semillas son uno de los pilares de la actual crisis ecológica. Parte de las publicaciones de Marx y de autores influidos por él establecen las bases teóricas de la reflexión. Se espera que el texto contribuya a la necesaria crítica del diluvio capitalista que nos amenaza.
Palabras clave: semillas-mercancía, subsunción real de la naturaleza al capital, fractura metabólica.
Introduçāo
No livro I de O Capital, Marx (1956a) usou a expressão de origem francesa “Depois de mim, o dilúvio” para simbolizar a máxima indiferença do capitalista com o esgotamento da força de trabalho e, por conseguinte, do próprio planeta, desde que consiga valorizar o valor e majorar seus lucros. Isto é, para o pensador alemão havia uma ausência de constrangimento por parte do capitalista com a degradação dos indivíduos e a mais absoluta incompatibilidade de qualquer regime de acumulação do capital com o metabolismo da natureza. De acordo com Burkett (1999), Marx estava devidamente ciente de que o valor e o capital são essencialmente antiecológicos.
Consideramos que essas premissas marxianas são fundamentais para a compreensão da atualidade da problemática das sementes sob o capitalismo contemporâneo. Há muito, as sementes deixaram de ser organismos vivos indispensáveis à produção de alimentos e à sociabilidade dos indivíduos para se converterem em mercadoria. Marx (1968, 1973), habilmente, detectou essa metamorfose do papel das sementes, pontuando a inevitabilidade de sua mercantilização sob o capitalismo e como elas acabariam sendo produzidas de modo fabril, tal como outros produtos agrícolas, com o fito de atender ao processo de acumulação de capital.
Essa previsão acabou se confirmando no século XX, quando as corporações empresariais alcançaram notoriedade com a ampla comercialização de sementes. A técnica de hibridização forneceu um impulso precioso para a generalização desse tipo de produto, ao criar variados germoplasmas com rendimentos deliberadamente decrescentes (Lewontin e Berlan, 1986; Kloppenburg, 2004, 2014). Cercadas de muita promoção propagandística que sinalizava suposta superioridade agronômica e utilidade nos “esforços” de combate à fome do período posterior à Segunda Guerra Mundial, essas sementes logo se espalharam pelos países, contando com a complacência e com os volumosos subsídios dos Estados.
A generalização da forma mercadoria das sementes, em especial, das sementes híbridas, recrudesceu a pilhagem de germoplasmas, ensejando a erosão das sementes crioulas ou nativas e ocasionando a crescente dependência dos agricultores. Embora a transformação das sementes em mercadoria tenha se iniciado antes do processo de hibridização, é relevante considerar que os produtos derivados dessa técnica representaram um primeiro e importante passo para a consecução do exercício monopólico sobre os códigos genéticos dos bens da natureza e, por sua vez, do controle sobre a (re)produção da vida humana.
No entanto, é no último quartel do século XX que é registrada uma mudança de grande envergadura: vem à tona a inédita transgênese de sementes. Adornada com toda sorte de epítetos graciosos sobre sua alegada virtude, essa tecnologia rapidamente chegou às lavouras, contando com a desregulamentação dos controles fitossanitários dos Estados nacionais e com o poderoso lobby das corporações empresariais. Diferentemente da hibridização, a transgenia está baseada numa alteração na sequência genética das sementes, imputando-lhe, em âmbito laboratorial (ex situ), características absolutamente estranhas ao germoplasma de origem (Bartra, 2006; Engdahl, 2007).
O advento da transgênese de sementes trouxe precedentes altamente perigosos. Derivadas de manipulação nos departamentos de pesquisa e desenvolvimento das corporações empresariais, essas sementes passaram a circular protegidas por patentes impostas para restringir o acesso livre dos agricultores. Mais tarde, esses germoplasmas foram alvo de técnicas genéticas de restrição de uso. Seu ponto fulcral estava em ser útil para impedir ou limitar a ressemeadura, atacando uma das condições mais elementares da multimilenar agricultura e garantindo, assim, um público cativo para o mercado sementeiro.
Muito recentemente, uma outra tecnologia juntou-se à transgenia de sementes, a edição genética. De disseminação ainda incipiente, é a nova aposta das corporações empresariais que têm exercido seu lobby para acelerar a circulação desse novo produto. Trata-se de um germoplasma submetido a uma manipulação laboratorial em que genes são ativados ou desativados ao sabor da demanda de mercado.
As intervenções laboratoriais na genética de sementes, no interior das corporações empresariais, materializam uma investida muito mais danosa que a conversão das sementes em mercadoria e/ou a pilhagem de germoplasmas. São orientadas por um objetivo ardiloso, mas enevoado com a retórica mainstream de proteção de culturas agrícolas e elevação de produtividade das lavouras. O que está subjacente é a aspiração monopólica sobre os códigos genéticos dos bens da natureza como ferramenta valiosa para o controle sobre a (re)produção da vida humana.
É um movimento em que os capitalistas o fazem abdicando de quaisquer preocupações com os múltiplos desdobramentos da liberação de organismos vivos estranhos e monopolizados nos campos agrícolas. O aumento da dependência dos agricultores, a fragilização da já combalida soberania alimentar e a maiúscula ameaça à agrobiodiversidade do planeta são simplesmente desprezados. A metáfora cunhada por Mészaros (2003) é adequada como síntese desse processo: “abertura de uma nova caixa de Pandora” (p. 39).
Nesse sentido, o presente texto realiza uma análise da problemática das sementes-mercadoria sob o capitalismo contemporâneo, identificando as principais contradições inerentes ao domínio capitalista sobre um organismo vivo tão precioso à (re)produção da vida humana, compreendendo esta como a “reprodução das condições que permitam a continuidade da espécie dadas determinadas relações sociais e circunstâncias [...]” (Antunes, 2019, p. 282). Parte-se do pressuposto de que as manipulações genéticas nas sementes, entabuladas pelas corporações empresariais, são um dos pilares da crise ecológica em curso. Por crise ecológica, entende-se como “manifestação da perturbação do metabolismo natural por meio da forma capitalista de metabolismo social” (Saito, 2021, p. 125).
Para dar concretude ao texto recorre-se aos fundamentos da crítica à economia política burguesa, elaborados por Marx (1956a, 1956b, 1968, 1973, 2008). Ele trouxe aportes muito úteis que servem de base teórica para a nossa reflexão, como: a relação metabólica das sociedades humanas com a natureza, o trabalho como mediador ontológico e histórico dessa relação metabólica e a conversão das sementes na forma mercadoria. A partir de Marx, duas categorias são frequentemente usadas em investigações contemporâneas de lastro marxista, a saber: subsunção formal e real da natureza ao capital e; fratura metabólica da relação humana com a natureza. A primeira é manejada por Boyd, Prudham e Schurman (2001) para designar como a natureza é redefinida para atender à dinâmica de valorização do valor. É um aporte oportuno para lançar luz sobre como o domínio da genética de sementes pelo capitalismo lhe dá uma capacidade gigantesca de controle da vida ao tempo que cria temerosos riscos. A segunda é fomentada por Foster (1999, 2000), Burkett (1999), Burkett e Foster (2006) e Saito (2021, 2022), ademais de outros autores, baseando-se na existência de fratura metabólica na relação humana com a natureza, que não pode ser reparada sob o capitalismo. Pelo contrário, o modo de produção capitalista tende a aprofundá-la, e o aparecimento das sementes geneticamente modificadas concorre, indubitavelmente, para o alargamento dessa fratura.
O texto está dividido em três seções. Inicialmente, é realizada uma apreciação das determinações essenciais da condição das sementes como mercadoria no capitalismo. Em seguida, os esforços são direcionados para pôr em evidência o papel das sementes-mercadoria, notadamente, os germoplasmas decorrentes de transgênese, como manifestação angular da subsunção real da natureza ao capital. Por último, é feita uma tentativa de situar a produção e a disseminação das sementes-mercadoria como episódios relevantes para o fraturamento do metabolismo dos humanos com a natureza e para o agravamento da crise ecológica em curso.
As determinaçōes das sementes-mercadoria
A obra seminal de Marx, O Capital, é inaugurada com o capítulo da mercadoria. Essa escolha, longe de ser arbitrária, refletia seu método dialético de análise da realidade objetiva, a saber, tomar a unidade mais elementar das formações sociais regidas pelo capitalismo como síntese de múltiplas determinações. Como explicou Kosík (1969), a mercadoria é o seu ponto de partida, “seu início abstrato, cujo desenvolvimento reproduz a estrutura interna da sociedade capitalista” (p. 31).
Marx, oportunamente, recorreu à mercadoria como ponto de partida de sua exposição por se tratar de uma miríade de produtos que estão por toda parte, ou seja, é a manifestação mais fenomênica da sociedade capitalista. O geógrafo David Harvey (2013) assim definiu a opção de Marx: “começar com as mercadorias se revela muito útil porque qualquer pessoa tem contato e experiências diárias com elas. [...]. A forma-mercadoria é uma presença universal no interior do modo de produção capitalista” (p. 18-19).
As sementes, assim como uma infinidade de outros elementos, aparecem na presente quadra histórica tal como uma tangível “coleção de mercadorias”, para utilizar uma expressão do próprio Marx (1956a, p. 27), comercializadas em qualquer parte do planeta, inclusive, em países detentores de considerável agrobiodiversidade[1]. Pode-se afirmar que o capitalismo é o primeiro modo de organização societal que eleva a semente à condição de mercadoria, imprimindo um caráter fabril à sua produção e galvanizando sua distribuição, sua circulação e seu consumo em escala global.
Marx (1968, 1973) já havia sinalizado que a expansão do capitalismo transformaria as sementes em artigos demandados mundialmente, asseverando que a agricultura seria orientada, progressivamente, por uma lógica industrial que encerraria seus elementos no âmbito do mercado, a exemplo do comércio de grãos sob o qual estariam as sementes. O divórcio dos camponeses da terra, do solo e da propriedade das condições de produção (Marx, 1973) foi episódio histórico fundamental para que o negócio com sementes fosse levado a cabo. Isto é, um longo, conflituoso, sangrento e ainda não finalizado processo de expropriação primária, materializado em vários rincões do planeta, constituiu o esteio para a conversão das sementes em mercadoria.
Como mercadoria do capitalismo, as sementes possuem uma dupla determinação: valor de uso e valor. O primeiro, o valor de uso, é proveniente das propriedades físicas e da capacidade das sementes de serem socialmente relevantes. À luz de Marx (1956a), é a utilidade das coisas, o fato de ser útil independentemente de sua diversidade de formas, volumes, texturas, etc. Se em tempos remotos a semente era uma prodigalidade da natureza, o trabalho humano na agricultura, baseado na seleção das melhores sementes e na ressemeadura, logrou obter sementes mais próximas das demandas sociais, imprimindo as marcas da atividade laboral nesses germoplasmas. As sementes, como é sabido, possuem várias finalidades, as mais conhecidas estão relacionadas ao nexo biológico da produção no campo (Kloppenburg, 2004), a saber: transformar-se em novos organismos vivos, contribuir com a fertilidade do solo e alimentar pessoas e animais. Dentre as menos conhecidas, embora indiscutivelmente relevantes, está sua dimensão cultural, isto é, trata-se de um artefato que ultrapassa a esfera agrícola ou produtiva e alcança a tessitura social das relações de trabalho e convívio no campo, como ocorre com muita frequência em comunidades camponesas da América Latina que celebram com regularidade a existência das sementes. Portanto, esse é, sinteticamente, o valor de uso das sementes, compreendendo as expressões fenotípicas desses germoplasmas, combinadas com as finalidades sociais que são síntese do trabalho que medeia a relação humana com a natureza.
O valor, por sua vez, é o trabalho humano em abstrato presente na produção/reprodução da semente. Como explicou Marx (1956a), a quantidade de trabalho humano socialmente necessário é quem determina o valor das mercadorias, tendo sua medida pela duração do tempo. Nesse sentido, o valor de uso das sementes serve apenas como um veículo sobre o qual repousa o valor, sendo a produção/reprodução deste último a raison d’être do capitalismo. O valor das sementes, produzido pelo trabalho abstrato socialmente necessário, manifesta-se no valor de troca, uma vez que este é a maneira como a substância do valor se expressa ou, como assinalou Carcanholo (2013), “a proporção de intercâmbio entre duas mercadorias” (p. 200).
De acordo com Marx (1956b, 1968), as sementes são incorporadas ao processo produtivo capitalista como parte do capital constante. Isso significa que elas são compreendidas como um componente dos meios de produção no espaço agrário, de modo que um maior emprego de sementes por parte do capitalista pode representar um aumento da composição orgânica do capital[2]. Localizadas no interior do capital constante, as sementes formam o capital circulante, aquele que é inteiramente consumido em cada jornada produtiva e que necessita ser reposto para que a reprodução seja possível. A propósito, essa é uma das divergências entre Marx e Adam Smith. Este último considerava que as sementes eram capital fixo caso se mantivessem nas mãos de um mesmo proprietário a cada ciclo, concluindo que os agricultores logravam lucro não pela sua comercialização em si, mas pelo seu crescimento (Smith, 1981). Marx fez uma crítica contundente a essa premissa smithiana, advertindo que o economista inglês confundia capital circulante com a forma-mercadoria da semente e que esta, independente de vir da aquisição do agricultor no mercado sementeiro ou como resultado de sua própria colheita, ingressava na produção como capital circulante, um elemento dos meios de produção.
Marx (1968) expôs que quanto mais se complexificasse a divisão do trabalho no capitalismo, mais as sementes assumiriam a forma-mercadoria, sendo fornecidas à agricultura por indústrias sementeiras, em detrimento da existência de produtores individuais. O movimento de conversão das sementes em mercadoria deixaria de ser uma mera formalidade para se confirmar em algo fático. Embora não tenha aprofundado - e o desenvolvimento da indústria sementeira ainda era muito incipiente para tal propósito - Marx lançou as bases para o florescimento de uma discussão muito pertinente na contemporaneidade. Há investigações em curso acerca da transição da subsunção formal à subsunção real da natureza ao capital sob a qual estaria inserida a problemática contemporânea das sementes-mercadoria.
As sementes-mercadoria e a subsunçāo real da natureza ao capital
Um dos mais inquietantes movimentos do processo de acumulação do capital é a sua capacidade de absorção dos meios de trabalho. Foi Marx (1973) quem formulou com nitidez acerca disso ao argumentar que o capitalismo drena em direção às máquinas, como forças produtivas do capital, um amplo repertório de conhecimentos, entabulados pelo trabalho social pretérito. Dito de outra maneira, o modo de produção capitalista internaliza a síntese do trabalho social humano, substancializada em variados e infindáveis exemplares das forças produtivas, em nome do mais decidido objetivo de valorização do valor. Essa sucção do esforço físico e intelectual da coletividade humana avança a um estágio em que a subordinação ao capital se torna completa.
Marx (1956a) apresenta essa discussão ancorado nas categorias de subsunção formal e real do trabalho ao capital. A primeira estaria relacionada à extração do mais-valor absoluto, mediante a extensão da jornada laboral. Trata-se de uma forma primeva da exploração do trabalho excedente não remunerado em que prevalece, essencialmente, o controle sobre o capital variável. A segunda está relacionada à obtenção do mais-valor relativo. Para tal empreitada é necessário que o capitalismo lance mão de agudas transformações nas técnicas, na composição orgânica do capital. Consoante a definição marxiana: é o momento em que o modo de produção capitalista emula seus respectivos métodos, condições e meios (Marx, 1956b).
Como já antecipado, a exposição de Marx sobre a subsunção formal e real do trabalho ao capital serve de fundamento basilar para as reflexões posteriores acerca do papel das sementes-mercadoria no âmbito da subsunção real da natureza ao capital. Desse modo, é imperioso invocar os argumentos de Boyd, Prudham e Schurman (2001) sobre a questão. Os autores analisaram as particularidades da dinâmica industrial a partir de elementos da natureza, veiculando dois tipos de corporações: as indústrias baseadas na natureza não biológicas e as indústrias baseadas na natureza de matriz biológica. As indústrias baseadas na natureza não biológicas estão lastreadas numa subsunção formal ao capital. Conforme definição conceitual de Boyd, Prudham e Schurman (2001), a formalidade da subsunção reside no fato de que o capital não penetra a natureza, ele a circunda. Dessa forma, o propósito fundamental desse modelo industrial é transformar bens esquadrinhados e pilhados da natureza em mercadoria, sem que haja alterações em laboratório (ex situ) na própria maneira como esses bens se comportam. Dentre os exemplos estão a atividade mineradora, que depende essencialmente dos processos geológicos para a extração de minérios, e a pesca empresarial, que a despeito de contar com ações que visam facilitar sua execução, está inevitavelmente atrelada às correntes marítimas e à sazonalidade das temperaturas.
Por sua vez, as indústrias baseadas na natureza de matriz biológica se envolvem diretamente na alteração dos comportamentos de elementos naturais a fim de criar um nicho promissor de valorização do valor. Diferente de sua contraparte, esse tipo industrial ancora-se intencionalmente na manipulação das propriedades da natureza para atender aos imperativos de mercado. Elas estão, portanto, atreladas à subsunção real da natureza ao capital. Boyd, Prudham e Schurman (2001) advertem que essa forma específica de subsunção não implica uma obliteração absoluta da dinâmica natural dos elementos, mas uma manifestação inequívoca de como as forças produtivas da natureza se transformam em forças produtivas do capital.
Boyd, Prudham e Schurman (2001) destacam que o exemplo mais emblemático da subsunção real da natureza ao capital está na produção das sementes-mercadoria, mais precisamente, nos eventos da biotecnologia. Eles concordam com os argumentos de Kloppenburg (2004) acerca da técnica de hibridização de sementes que, na prática, funcionou como um prelúdio da captura da reprodução das plantas como uma forma de acumulação de capital.
Conforme Kloopenburg (2004, 2014), os capitalistas sempre se interessaram em aprofundar a separação dos produtores do acesso às sementes, a fim de garantir que estas se transformassem definitivamente em mercadoria. Desse modo, a ciência foi amplamente usada com o fito de elaborar uma semente que fugisse do controle dos agricultores e se aproximasse da lógica que preside o processo de acumulação de capital. A hibridização se constituiu nessa técnica, deliberadamente, massificada para a confecção de sementes destinadas a oferecer rendimentos decrescentes na agricultura. Por trás da mencionada iniciativa estavam os propósitos das corporações empresariais de: a) superar os obstáculos à conversão das sementes em mercadoria, uma vez que a biologia constitutiva desses germoplasmas permite sua livre reprodução na natureza; e b) limitar o ato multissecular da ressemeadura das sementes, forçando o agricultor a recorrer, sempre, ao mercado para uma nova aquisição.
De fato, à luz da história, é incontestável a relevância da hibridização no processo de conversão da semente à forma mercadoria e na criação e generalização de um mercado sementeiro. Lewontin e Berlan (1986) explicam que a técnica de hibridização apareceu em meados da década de 1910, nos Estados Unidos, e que seria impraticável sem dispor dos subsídios oferecidos pelos governos estadunidenses para a continuidade das pesquisas direcionadas de melhoramento genético. Eles asseveram que o declínio de rendimento dos híbridos de segunda geração contribuiu para normalizar o hábito da aquisição de novas sementes-mercadoria na agricultura. Um exemplo fornecido pelos autores é o milho híbrido, carro-chefe dessa técnica, cujas vendas cresceram vertiginosamente entre 1937 e 1945 naquele país.
Faz-se necessário ponderar que a emergência da Revolução Verde, após a Segunda Guerra Mundial, e a internacionalização de seus pacotes tecnológicos - sementes, fertilizantes, máquinas, agrotóxicos, etc. - nas lavouras de múltiplos países, fizeram da semente híbrida uma mercadoria de circulação global. Com o pretexto do combate à fome e elevação da produtividade agrícola, as grandes corporações empresariais, em especial, as de origem estadunidense, em articulação com os Estados nacionais e com algumas fundações (Engdahl, 2007), trataram de expandir o alcance dos exemplares de híbridos, inclusive, assegurando a canalização de fundos públicos para sua aquisição, através de programas governamentais de distribuição de sementes (Mooney, 1987; Patel, 2013).
Dessa feita, não resta dúvida de que a hibridização cumpriu um papel histórico de consolidar a semente como mercadoria na agricultura, mas é com a biotecnologia moderna - instrumentalizada pela engenharia genética - que a subsunção real da natureza se torna efetivamente viável. As alterações nas sequências genéticas, possibilitadas pelo translado de genes provenientes de organismos completamente diferentes, violam as barreiras biológicas e pavimentam o caminho para uma interminável engenhosidade laboratorial, emulada pelos departamentos de pesquisa e tecnologia das corporações empresariais. Como pontuaram Boyd, Prudham e Schurman (2001), o instrumento decisivo para a subsunção real da natureza ao capital é a capacidade de manipular programas genéticos e (re)fazer a natureza para que ela sintetize a própria dinâmica da valorização do valor.
Assim, as sementes transgênicas são a manifestação mais acabada da subsunção real da natureza ao capital, e o aparecimento desse tipo de semente, entre os anos de 1980 e 1990, é parte da ofensiva global coordenada pelos Estados Unidos e executada por gigantes corporações empresariais para subverter qualquer óbice de cunho legal, técnico, ético, etc. que impedisse a extensão da lógica de valorização do valor a dimensões da vida outrora invioláveis. Para os operadores do modo de produção capitalista, a mera pilhagem dos germoplasmas e sua conversão em mercadoria eram ações necessárias, mas insuficientes. Até mesmo as sementes híbridas se mostravam incapazes de contemplar os insaciáveis desejos desses sujeitos. O Rubicão[3] foi, efetivamente, atravessado. Desde então, a dinâmica de acumulação de capital baseou-se numa escalada crescente pelo exercício do controle monopólico sobre os códigos genéticos dos bens da natureza. Algo que o pesquisador mexicano Armando Bartra (2006) denominou de “la inédita industria de la vida” (p. 174). Conforme Bartra (2006), se no passado o monopólio da propriedade fundiária foi pródigo em fornecer generosa renda da terra aos seus detentores e, contraditoriamente, legou uma legião de expropriados e famélicos, o monopólio sobre os códigos genéticos promete ser ainda mais perturbador.
Talvez a medida mais flagrante dessa aspiração monopólica possa ser localizada no advento das tecnologias genéticas de restrição de uso, mundialmente conhecidas como GURT (Genetic Use Restriction Technologies). Trata-se de um artefato criado com o envolvimento direto do governo dos Estados Unidos, em parceria com uma empresa privada, em meados da década de 1990, que impõe restrições inéditas e de grande impacto na agricultura. Divide-se em dois tipos: Terminator e Traitor. O primeiro está lastreado no impedimento de germinação da semente de segunda geração. Em outras palavras, o agricultor poderá usar a semente transgênica uma única vez, pois os frutos de sua colheita não germinarão novamente, já que são programados para liberar células tóxicas que interditam o ciclo natural da vida (Lombardo, 2014). Não por acaso essas sementes são também nomeadas de suicidas (Paul et al., 2003). A segunda relaciona-se com a inserção de um traço na semente que pode ser acionado caso o agricultor use determinado agente químico (Lombardo, 2014). Por exemplo, a semente pode inibir a ação de insetos, caso seja acionada por meio de um agrotóxico que, não coincidentemente, é comercializado pela mesma empresa sementeira.
Terminator e Traitor são manifestações de tecnologias profundamente imbricadas nessa escalada monopólica. A tecnologia Terminator atenta contra o ato multimilenar da prática agrícola que é a ressemeadura, impelindo o agricultor à aquisição regular e compulsória de transgênicos. Ela golpeia o hábito de salvaguarda de sementes, prática usual em países com forte presença de camponeses, indígenas e povos tradicionais, além de assegurar o abreviamento da duração do processo de rotação do capital (P-D-C-C), o que acelera a realização do mais-valor e a captura da renda da terra. Como explicado por Steinbrecher e Mooney (1998), é uma mostra inconteste de controle corporativo sobre a produção da vida. Por sua vez, a Traitor, a despeito de aparentar ser menos nociva que a primeira, está programada sob o mesmo princípio: tornar o agricultor um consumidor cativo desses pacotes tecnológicos e encapsular a complexa prática agrícola em roteiros desenhados previamente pelos departamentos de pesquisa e desenvolvimento das corporações empresariais.
As contradições das tecnologias GURT são tão evidentes que, entre o final da década de 1990 e o início dos anos 2000, houve mobilizações pelo seu rechaço em várias partes do globo. Até a FAO/ONU, através de sua Comissão de Recursos Genéticos para Alimentação e Agricultura, emitiu relatório sinalizando preocupações com os possíveis efeitos de seu uso, como: contaminação de sementes, dependência dos agricultores e empoderamento dos monopólios (Visser et al., 2001). O resultado foi uma moratória global que impôs legislações restritivas em diferentes países. Contudo, as corporações empresariais não se contentaram com o revés, deram prosseguimento às pesquisas e ao patenteamento das sementes, além de intensificarem seu lobby para o fim das restrições. Importa mencionar que tramita projeto de lei (1117/2015), na Câmara dos Deputados do Brasil, para flexibilização do ordenamento jurídico da matéria, a fim de se assegurar o uso de tecnologias genéticas de restrição de uso em condições muito específicas. Caso aprovado, abrirá um grande precedente que deverá ser adotado e propagandeado pelos monopólios em outros países.
Recentemente, os departamentos de pesquisa e desenvolvimento das corporações empresariais têm apostado em uma outra frente de atuação: edição genética. Conhecida no Brasil como Técnicas de Melhoramento de Precisão (Timp) e, em outras partes do globo, como Precision Breeding Innovation (PBI), seus exemplares de germoplasma passaram a integrar o rol de mercadorias comercializadas. A rigor, funciona por meio da ativação ou desativação de genes, a fim de garantir que o organismo vivo expresse a característica desejada (Fernandes, 2019). Desse modo, a intervenção da engenharia genética é essencial para moldar uma semente com a programação idealizada pelo mercado. Os signatários dessa tecnologia, buscando evitar uma possível moratória, como ocorrido com as GURT, valem-se do argumento de que não se trata de um organismo geneticamente modificado, mas de uma intervenção genética seletiva em que não há cruzamento de genes oriundos de espécies diferentes. Porém, a despeito da possível divergência com essa questionável justificativa, a contradição essencial a ser observada é que a edição genética consubstancia mais uma evidência da subsunção real da natureza ao capital.
Em síntese, a transgênese de sementes - da qual fazem parte as tecnologias genéticas de restrição de uso - e a edição de genes decorrem desse contínuo movimento operado pelos monopólios para a subsunção real da natureza ao capital. As sementes-mercadoria se transformaram em ferramentas muito poderosas para o controle da (re)produção da vida humana - ou, como sublinhou Berlan (2011), para a expropriação de todas as dimensões da vida - pelas corporações empresariais, ensejando, por conseguinte, múltiplos e perigosos riscos, já presentes na contemporaneidade, a exemplo da erosão genética, da contaminação de sementes crioulas ou nativas por espécies transgênicas, do amplo uso de agrotóxicos e de outras perturbações ecológicas (Mooney, 1987; Boyd, Prudham e Schurman, 2001; Lima, 2021).
Sementes-mercadorias como aprofundamento da fratura metabólica
Em várias passagens de sua crítica à economia política burguesa, Marx trouxe importantes apontamentos sobre o caráter ontológico e histórico da relação do homem com a natureza. O homem em Marx não é concebido como um indivíduo que age como um lobo solitário, alheio às relações sociais ou um agente com ações robotizadas e previsíveis, mas como um “sujeito da práxis, que existe transformando o mundo e a si mesmo” (Konder, 2010, p. 18). A natureza, por sua vez, não é tomada por Marx como um mero recurso natural a ser apropriado pelo homem. Pelo contrário, a natureza encerra uma complexa dinâmica ecológica que, a rigor, independe da atividade humana, mas que é impactada e essencial por/para esta última.
A imprescindibilidade da natureza para a atividade humana radica no fato de que a universalidade humana para Marx (2008) pressupõe o estabelecimento de uma relação infindável com a natureza. “A natureza é o corpo inorgânico do homem [...]. O homem vive da natureza significa: a natureza é o seu corpo, com o qual ele tem de ficar num processo contínuo para não morrer” (p. 84).
Marx adota a categoria de metabolismo para a apreciação da relação humana com a natureza. Mais que uma analogia fisiológica, emprestada das chamadas ciências naturais, a categoria representa a permanente troca de matéria e energia que acompanha cada sociedade em seu devido tempo histórico (Burkett e Foster, 2006). Na compreensão marxiana, há uma complexa interdependência entre as sociedades humanas e a natureza, uma coevolução em que se verifica uma influência mútua (Foster, 1999).
A interação metabólica com a natureza é mediada pelo trabalho humano. No exercício do trabalho, o homem se relaciona com os elementos naturais a fim de realizar as necessidades socialmente demandadas. Como explicado por Marx (1956a), o trabalho é inseparável da vida humana e materializa-se por uma ação intencional em que a corporeidade do indivíduo, consubstancializada em sua própria força natural (braços, pernas, cognição, etc.), é posta em movimento para confrontar a natureza. No bojo desse processo, a natureza é transformada, ao tempo que o homem também é transformado, ratificando o que pode ser compreendido como uma coevolução mútua. É oportuna a afirmação de Burkett (1999) quando considera, à luz dos escritos marxianos, que o trabalho não ocorre à margem das condições objetivas, devendo ser examinado no âmbito de relações sociais materializadas sob determinados limites naturais. E acrescenta que as forças produtivas sociais do trabalho somente podem operar pelo fato de serem uma força natural suficientemente habilitada a se apropriar da natureza, modificando-a, produzindo novos valores de uso e, no limite, valendo-se do corrente e potencial valor de uso fornecido por ela.
Ocorre que esse metabolismo entre o homem e a natureza é duramente perturbado pela dinâmica de acumulação de capital. Marx (1956a) observou que os florescimentos da moderna indústria e da agricultura de base industrial concorreram para a formação de grandes centros urbanos, dotados de expressivas concentrações populacionais, que demandaram alimentos e vestimentas das áreas rurais, provocando o esgotamento dos solos. A imperiosa necessidade de prosseguimento desse metabolismo social, a fim de assegurar a continuidade do processo de acumulação de capital, impediu a reposição dos nutrientes necessários extraídos dos solos e transladados a outras regiões ou países, interferindo no metabolismo da natureza. Por isso, ele asseverou que, sob o capitalismo, qualquer avanço nas forças produtivas, no campo e na cidade, seria traduzido em dilapidação da terra e destruição física do trabalhador.
Foster (2000) contextualiza que o esgotamento dos solos era a grande preocupação do século XIX na Europa e na América do Norte, e que os estudos de Justus von Liebig na seara da química agrícola foram fundamentais para a aproximação de Marx com a temática. Ainda de acordo com Foster (2000), a ruptura metabólica ensejada pela expansão do modo de produção capitalista na agricultura e no espaço urbano foi crucial, na leitura de Marx, para a compreensão da alienação da natureza e de sua estreita relação com a alienação do trabalho.
Saito (2021) argumenta que apesar de Marx ter direcionado sua apreciação para a ruptura metabólica no âmbito do modo de produção societal capitalista, ela não nutria qualquer visão ingênua ou idílica de que sociedades pretéritas mantinham uma relação desprovida de qualquer contradição com a natureza. De acordo com Saito (2021), o cerne da análise marxiana era examinar “como a mediação da interação social e natural entre humanos e natureza pela lógica da valorização do capital organiza a produção social e a circulação de tal forma que seu intercâmbio metabólico é necessariamente interrompido” (p. 155).
Há que se registrar que essa ruptura metabólica não era vista por Marx como episódica, também não era tomada como contornável, tratava-se de algo irreparável sem a superação dos estreitos limites da valorização do valor impostos pelo capitalismo (Foster, 1999). Saito (2021) argumenta que Marx chegou à conclusão que “enquanto o modo de produção capitalista estrutura um determinado metabolismo humano em escala nacional e global, as forças da natureza são, embora elásticas, sempre limitadas de várias maneiras, resultando em ecocrises em múltiplas esferas” (p. 155). Nesse sentido, Burkett (1999) destacou que Marx considerava que a implacável captura dos valores de uso provenientes da natureza e do trabalho humano e a reprodução do capital em escala cada vez maior, estendendo suas contradições para o âmbito global, fazem do capitalismo o primeiro modo de produção apto a causar uma catástrofe planetária, que ameaça a existência humana e, contraditoriamente, as bases para a continuidade da valorização do valor.
As considerações de Marx acerca da fratura metabólica na relação humana com a natureza nos oferecem um arsenal teórico para a investigação das contradições do capitalismo contemporâneo. É possível afirmar que as sementes-mercadoria, notadamente, as transgênicas - associadas ou não às tecnologias genéticas de restrição de uso - e a edição genômica se constituem em eventos sumamente relevantes para o aprofundamento da fratura metabólica.
Compreende-se que a pilhagem de sementes e sua conversão em mercadoria, reforçada pelo emprego da técnica de hibridização, concorreram para fraturar esse metabolismo, uma vez que impulsionaram a privatização de organismos vivos, a crescente dependência da aquisição de insumos por parte dos agricultores, o estreitamento da base genética, além de terem colaborado para a subsunção real da natureza ao capital. Contudo, o advento da transgenia de sementes, no último quartel do século XX, potencializou a gravidade da situação. Isso porque, ademais de figurar no contexto da privatização dos germoplasmas, as sementes transgênicas e as tecnologias de restrição de uso são desdobramentos de uma deliberada manipulação genética que viola, sem qualquer paralelo, a dinâmica da natureza, imprimindo uma estranha engenharia em seu modo de atuar, motivada pelo objetivo de valorização do valor e aumento do poder monopólico das corporações empresariais. Como destacou Saito (2022), trata-se da subsunção real da natureza em que o capital inaugura novos mercados no meio da ruptura metabólica.
Ou seja, não se refere somente à uma preocupação com a mercantilização das sementes e, por conseguinte, da oferta de alimentos, a transgenia de germoplasmas e toda sorte de expedientes derivados dela conferem aos monopólios uma capacidade inédita de controle sobre a (re)produção da vida humana e agudizam uma crise ecológica de consequências imprevisíveis. As sementes Terminator, por exemplo, advertidas de modo oportuno por Wolf (2007), são um monstro biológico que ademais de colaborar para a monopolização dos códigos da vida realizam uma violação da ecologia e de milhares de anos de prática agrícola.
A ampla disseminação das sementes-mercadoria, em especial, as sementes transgênicas, tem se mostrado desastrosa no capitalismo contemporâneo. Anunciadas como solução para o aumento da produtividade, enfrentamento às plantas adventícias e às “pragas”, além do combate à fome, essas tecnologias do capital são um escancarado fracasso, ratificando a perspicaz observação de Berlan (2011) de que o “impulso para o lucro e controle social ocorre, como sempre, por detrás de uma desculpa [...]” (p. 157). O aumento de produtividade não costuma ser considerável e é dependente da aquisição permanente do pacote tecnológico monopolizado, as plantas indesejadas e as “pragas” não raramente conseguem criar resistência ao coquetel químico empregado - levando ao incremento de pesticidas ainda mais tóxicos e ambientalmente impactantes - e a fome permanece insólita, confirmando que a Agenda 2030 da ONU não passa de uma distração para os reais problemas da presente quadra histórica.
Um fato muito perigoso e que exige registro é que a generalização das sementes-mercadoria produz inúmeros episódios de contaminação de sementes crioulas ou nativas por espécies transgênicas. São muitos os relatos desse insucesso em países da América Latina, da África e da Ásia, onde consta uma relevante agrobiodiversidade e onde as relações sociais de produção no campo não foram completamente dobradas ao modus operandi do processo de acumulação do capital. No semiárido brasileiro, 1/3 das sementes de milho crioulo de camponeses, indígenas e quilombolas foi contaminada por variedades transgênicas entre 2018 e 2021 (Fernandes et al., 2023). Por sua vez, no México, centro de origem do milho, houve registro de um fluxo transgênico no estado de Oaxaca, em decorrência, provavelmente, da flexibilização para cultivo de organismos geneticamente modificados, executada em 2009 (Preciado, 2022). Também há relatos de contaminação com transgênicos em países como Índia e Filipinas (Grain, 2022). A respeito do continente africano, a acentuada fragilidade de controle fitossanitário por parte da esmagadora maioria de seus Estados nacionais, somada às contínuas importações de alimentos e recepção de ajuda alimentar, conformam um quadro muito propício à contaminação das sementes crioulas ou nativas de seus agricultores por organismos geneticamente modificados (Peschard, Golay e Araya, 2023).
Há que se destacar que a torrencial disseminação de sementes transgênicas nas superfícies agrícolas do globo conduz, invariavelmente, à perda da agrobiodiversidade. A simplificação genética, imposta pelo capital, enseja elevados riscos, como o desaparecimento de germoplasmas que fornecem alimentos a amplas comunidades rurais e que são signos, carregados de imenso simbolismo, da solidariedade comunitária, do afeto e da sociabilidade à margem da valorização do valor. Ademais e não menos importante, perturba o equilíbrio ecológico, abrindo um flanco para mudanças nas estruturas tróficas, para o aumento de espécies invasoras e erosão de espécies crioulas ou nativas, liberação de patógenos potencialmente pandêmicos, etc. (Fernández Durán, 2011; Moranta et al., 2022).
A edição genética de sementes, não obstante se trate de uma tecnologia muito recente e cujos potenciais efeitos ainda não foram completamente mensurados, produz preocupações semelhantes (Lander, 2015). Está inscrita na lógica do capital e, portanto, é uma mercadoria que aparece para render lucros e servir como instrumento de controle monopólico, em detrimento dos desequilíbrios ecológicos que possa provocar. A liberação de germoplasmas submetidos à edição genética nos biomas é uma verdadeira temeridade, pois não se tem clareza de como esses organismos se comportarão junto aos ecossistemas terrestres e aquáticos (Fernandes, 2019; Nohama, Silva e Simão-Silva, 2021). No Brasil, até junho de 2023, quase 50 produtos provenientes de edição gênica foram aprovados pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNbio (Amâncio, 2023). Tudo feito com muita rapidez, com forte apoio do Estado, influenciado pelo poderoso lobby dos operadores do agronegócio e dos representantes das corporações empresariais e baseado na manobra discursiva e brecha legal de se considerar a edição gênica como técnica não transgênica. Policante e Borg (2024) informam que algo similar se passa na União Europeia, onde os produtos decorrentes de edição gênica - que são rotulados como transgênicos naquele bloco - poderão ter sua avaliação de risco e autorização desregulamentadas.
Nenhuma das contradições aventadas anteriormente parece capaz de suplantar ou desestabilizar as ações das corporações empresariais. Preocupadas, exclusivamente, com a reprodução ampliada dos capitais investidos e a remuneração de seus acionistas, essas companhias celebram os números da comercialização global de germoplasmas. Os dados estatísticos apontam que, em 2018, foram movimentados quase 21 bilhões de dólares com sementes transgênicas e pouco mais de 17 bilhões com as consideradas não transgênicas, na qual estão incluídos muitos dos exemplares de híbridos (IHS Markit, 2019). Ademais, há projeção de significativo crescimento das primeiras até o final de 2032, estimando-se um alcance de 41 bilhões, aproximadamente (Fortune Business Insights, 2024).
Resta-nos suficientemente claro que a fratura metabólica da relação humana com a natureza é alargada com o avassalador domínio dos monopólios sobre as sementes. Modificados geneticamente, esses germoplasmas mais parecem um artefato fantasmagórico e exógeno que organismos vivos tão fundamentais à prática agrícola, à alimentação e à cultura dos povos. Os capitalistas ignoram as contradições desse processo, movidos pelo pantagruélico objetivo de valorização do valor, escalam sua incursão sobre a natureza a fim de subsumi-la, normalizando os riscos decorrentes. As alegadas tecnologias “promissoras” de modificação genética, a exemplo da transgênese e da edição genômica, nada mais são que operações propositais para moldar o funcionamento dos elementos naturais, encapsulando-os no metabolismo social capitalista. Esse constante brincar com a natureza, parafraseando Mészaros (2003), tende a ser letal, porquanto aprofunda uma crise ecológica que não poderá ser superada no âmbito da ordem do capital.
Consideraçōes finais
O texto, certamente, não esgota a complexidade do fenômeno. Seu aporte teórico esteve lastreado pela crítica, legada por Marx, à economia política burguesa, através da qual buscou-se produzir uma síntese que articulasse uma discussão sobre as contradições inerentes à conversão das sementes em mercadoria, seu crescente controle monopólico pelas corporações empresariais, as manipulações genéticas de germoplasmas como manifestações da subsunção real da natureza ao capital e o debate sobre a fratura metabólica da relação humana com a natureza. Reconhece-se que esse é um fio condutor muito oportuno para a apreciação da crise ecológica em andamento.
É sob o crivo implacável da história que a metáfora empregada por Marx alcança ainda mais sentido. O dilúvio não é uma possibilidade remota ou um futuro incerto, ele já se materializa na contemporaneidade em que o metabolismo social, dirigido pelo modo de produção capitalista, prevalece e avança em direção ao mais absoluto controle empresarial sobre a (re)produção da vida humana.
As sementes, definitivamente, foram convertidas em mercadoria, dotadas de valor de uso e valor. São produzidas através do trabalho humano abstrato socialmente necessário e estão inseridas no âmago do processo de acumulação de capital. Adornadas com todo tipo de apelo propagandístico, são produzidas e comercializadas amplamente, sob a hegemonia de um punhado de corporações empresariais. Os germoplasmas são mapeados e esquadrinhados, e a biopirataria goza de relevância, integrando o portfólio da renhida disputa de caráter monopolista.
As décadas finais do século XX testemunharam uma ofensiva inédita dos operadores do capitalismo. Uma dimensão importante disso envolveu o uso da biotecnologia moderna associada à engenharia genética para criar novos nichos de acumulação. Foram lançadas as sementes transgênicas, provenientes de deliberada manipulação de genes em laboratório. Com o poderoso lobby das companhias envolvidas e com a escancarada flexibilização dos regramentos fitossanitários dos Estados nacionais, esses germoplasmas transgênicos adentraram numa parte considerável da superfície agrícola do globo.
A tecnologia de transgênese de sementes, bem como a recém disseminada edição genética, são evidências cristalinas do movimento de subsunção real da natureza ao capital. Redefinir o funcionamento dos elementos da natureza para que ele se encaixe no curso da valorização do valor é o que orienta esse processo, em detrimento de qualquer consideração sobre seus múltiplos riscos. Quanto mais se consegue “dobrar” a complexa dinâmica da natureza aos propósitos mais estreitos e imediatos da economia capitalista, maiores as chances de lograr o exercício do controle monopólico sobre os códigos genéticos e, obviamente, sobre a (re)produção da vida humana. Aí se localiza o fulcro de toda essa aspiração: submeter as sociedades aos imperativos inadiáveis e insaciáveis do capital.
A disseminação desses organismos geneticamente modificados nos campos tem rendido desdobramentos demasiadamente perigosos. Acumulam-se episódios de contaminação de sementes nativas ou crioulas, desaparecimento de espécies endêmicas, incremento no uso de agrotóxicos e outros produtos químicos, dentre tantas perturbações ecológicas correlatas. Também é cada vez mais evidente a dependência dos agricultores em relação a esses germoplasmas, que têm a sua renda da terra capturada sistematicamente pelas corporações empresariais, e a contínua fragilização da soberania alimentar.
Tendo em vista que a relação metabólica dos humanos com a natureza está fraturada, o advento da transgenia e da edição genética de sementes concorre para o aprofundamento dessa fratura, pois o metabolismo social, dirigido pelo modo de produção capitalista e orientado para a ininterrupta valorização do valor, intensifica a perturbação do metabolismo natural, imprimindo novas marcas nesse desequilíbrio ecológico. É, portanto, uma crise ecológica que não será vencida sem a superação da ordem do capital. Nesse quadro aterrador, não há conciliação possível ou seguiremos atormentados pelo dilúvio.
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Notas